domingo, 3 de agosto de 2008

Samarcanda

Ainda navego por entre brumas cinzentas. Espero e confio. Respiro fundo, uma e outra vez, para recomeçar tudo novamente. Um dia após o outro e um dia de cada vez.

No entanto a vida não se compadece de momentos menos bons e por entre estes mares mais agitados cujo rumo vou tentando acertar, o quotidiano prossegue e com ele as rotinas que de mim esperam concretização. Adiante, portanto.

Tive um único professor de filosofia que nos acompanhou durante os 3 anos. Era uma figura peculiar e ainda hoje recordo com saudade as suas aulas. Foi numa dessas aulas que fiquei a conhecer a lenda árabe de Samarcanda.

Segundo a lenda, estava um mercador árabe exercendo o seu mister quando o seu servo mais fiel lhe apareceu muito aflito. Tinha visto a morte junto aos portões de entrada da cidade e esta o fitou muito demoradamente. Angustiado, o mercador que tinha elevada estimada por ele, logo se prontificou a ajudá-lo, disponibilizando o seu melhor cavalo e umas moedas de oiro para que pudesse fugir para longe, para Samarcanda.
No dia seguinte, o mercador encontrou a morte junto ao mercado e a questionou porque tinha olhado tão demoradamente para o seu servo. Esta respondeu que tinha ficado surpreendida por o encontrar ali, já que tinha um encontro marcado com ele em Samarcanda.

Recentemente tive uma reunião numa dada entidade estatal. Lá estava o grande hall, as floreiras e vasos com plantas cujo tamanho denunciava antiguidade. A simpatia da funcionária da recepção contrastava com o minimalismo austero do ambiente. Após uma deselegante e longa espera, fomos finalmente conduzidos por entre corredores labirínticos até à sala onde mais uma vez tivemos de aguardar. Enquanto aguardava mais uma vez ia observando o local e pousei os olhos num poema que alguém tinha escrito com letras recortadas

Agora que o silêncio é um mar sem ondas
E que nele posso navegar sem rumo
Não respondas
às urgentes perguntas que te fiz
Deixa-me ser feliz
Assim
Já tão longe de ti como de mim

Súplica de Miguel Torga

Dei por mim a recordar a lenda de Samarcanda e como certos pensamentos encontram sempre uma forma, por vezes ardilosa de me encontrar. Nem que seja num corredor bafiento escritos a letras recortadas de jornal…

5 comentários:

R. disse...

Minha querida, sei bem do que falas. Eu acho que não são os pensamentos que nos procuram mas somos nós que criamos amarras, ainda que por vezes possam parecer invisíveis, a eles. Importa arranjar uma ferramenta forte que ajude a cortar estas amarras mas eu sinceramente tb ainda não a encontrei. Espero que em breve a descubras.

um gde beijinho

Sérgio Pontes disse...

Olá, Olá,

Tens lá uma mensagem no meu cantinho...

Beijocas

Anna72 disse...

Não conhecia a lenda mas gostei muito. Obrigada por partilhares ;)

Beijocas

(In)fertilidade no Algarve disse...

... e esta parece ser a encruzilhada da vida. Lembra-te que a nossa mente é como uma lanterna num quarto escuro...
Espero que esse foco de luz ilumine aquilo que está escondido.
Beijinho grande
Carla
www.escuta-sorriesente.blogspot.com

Ana disse...

Fiquei inquieta ao ler as tuas palavras.
So encontro uma palavra para te dizer: Tem fe, nao te atormentes, fecha os olhos e acredita.
Um abraco com muito carinho